quinta-feira, agosto 18, 2005

Por uma causa justa.

A situação se configurou daquela forma porque a irmã mais nova dele, Cecília, contou tudo para o pai. Quando ele chegou em casa, seu pai estava na mesa da copa, com um whisky e um cigarro.
- Senta aí, filho, que nós precisamos conversar.
- Boa noite, velho.
- É. Boa noite. Tá indo para a faculdade?
- Tô. Daqui a pouco. Passei aqui porquê precisava falar com o senhor.
- Eu também preciso. Sua irmã me contou que você anda faltando umas aulas...
(Essa pirralha dedo-duro.)
- Tenho, pai. Estou envolvido com o movimento estudantil. O que eu queria falar com...
- Movimento estudantil? Tá fazendo parte de algum DA, DCE, essas coisas?
- É, na verdade a gente está concorrendo com uma chapa, temos orientação marxista, e eu inclusive queria...
- E aquela conversa que a gente teve sobre você encontrar um emprego?
- Pois é, pai. Mas eu sinto que esse é um momento muito importante na minha vida, e a gente tá passando por uma fase muito delicada com essas questões como a reforma universitária, a diminuição das...
- Gustavo, não precisa entrar em detalhes, não. Olha só: eu acho muito bonito isso tudo, esquerdismo, socialismo. Eu voto na esquerda. Até sinto, de verdade, orgulho por você estar com essa consciência política. Mas eu não vou ficar bancando isso não.
- Mas, pai...
- Deixa eu te esclarecer uma coisa: aos catorze anos seu pai trabalhava entregando jornal na vizinhança, e lutou muito para te dar essa vida confortável que você tem hoje. Mas eu não vou ficar sustentando repetência sua, não. Se você quiser fazer suas coisas, tenha seu dinheiro para arcar com elas.
- Poxa, pai. Eu sinto que eu posso fazer alguma diferença no mundo, sabe? Eu sei que o senhor não pôde participar no seu tempo, por causa do trabalho, e tal. Mas veja por outra perspectiva! Agora, nós dois juntos, eu como agente e você como mecenas...
- Hahaha... Desculpe. Hehe. Desculpe, filho, sei que não é piada, mas a resposta é não.
- Olha, pai, eu inclusive vim pedir hoje para o senhor uma grana, para ajudar a chapa. Que hoje vamos fazer uma manifestação e precisamos comprar uns apitos, imprimir uns panfletos e tal...
- Não vou dar nada.
- Pô, pai. O que é que a Luísa vai pensar de mim?
- Luísa?
- É. É uma gatinha lá, do movimento. Sabe? Não é por isso que eu participo, claro, mas vai pegar mal. Eu garanti que eu conseguia alguma coisa.
- E essa menina tá dando mole para você? Já pegou?
- Tá na fita, mas ainda não peguei.
Neste momento, Cecília, que ouvia encostada na porta, sai correndo para o quarto, abre o orkut e vai em busca da página de recados da Luísa, a partir da lista de amigos do irmão. Ao encontrar, relata detalhadamente, e em letras vermelhas, a história do "tá na fita". Na copa, a conversa se conclui.
- Olha, bicho. Pode ir esquecendo essa história de mecenas. Aliás, para te incentivar a arranjar um emprego, vou diminuir, em quinze partes, sua mesada, até chegar a zero. Significa que daqui a quinze meses, você não tem mais mesada.
- Mas, pai...
- Hoje eu posso te dar vinte contos, para você não ficar mal lá. Mas veja isso como uma bondosa concessão do sue pai. E excepcionalíssima.
- Vinte reais? Mas eu estava pensando em...
- Nem diga, que eu não quero ouvir. E se pique, que já tá na hora da sua faculdade.
- Tá.
- Ó!
- Diga?
- E jogue duro lá, com a Luísa.
Quando Gustavo chega junto da galera, percebe que Luísa está olhando diferente para ele. Não imagina o porquê, ou a gravidade da decepção de ver o orkut, na sala de informática, acompanhada da Helena e da Patrícia. Se comporta como o usual.
- E aí, Taio? Conseguiu a grana com o velho?
- Vinte contos, só. Quanto vocês arranjaram aí?
- No total, com os seus vinte, setenta e cinco reais.
- Acho que é melhor a gente só pegar o baseado, vinho e cachaça, que a onda é longe e a gente ainda tem que botar gasolina no carro do Léo...
O colega chama ele no canto.
- Tá tudo armado, bróder?
- Hoje não tem erro. É bucha de terno garantida...

[]´s

11 comentários:

Anônimo disse...

Já estava comovida...quase aumento o côro no pedido da grana, pra ver se o pai aumentava um pouco...

E tem que ser uma Patricia participando da bucha de terno... Ô!!! :P

Muito massa seu texto, menino baiano!

Anônimo disse...

Puxa vida... pq eu só colo pedra nessa joça de dominó?! Tô precisando pelo menos praticar um pouco. beijocas.

Anônimo disse...

Muito bom texto! Você se aprimora a cada dia. A história me prendeu! E olha que eu pensei em não ler agora, por causa do tempo.
O pior que eu estava levando a sério toda essa história... hehehe.
E essa Cecília, hein? Miseravona! Típica irmã sacana...
Ainda bem que eu não tive uma assim...
Abração!

Anônimo disse...

não pensa em outra coisa heim....

Leonardo Caldas disse...

definitivamente gosto da forma leve como escreveu o texto! me fez lembrar a mim mesmo em meus bons tempos de descobertas político-herbais-sexo-filosóficas :)
parabéns... tá perfeito!

Gabi disse...

hahaha boa!

Marina disse...

Você é uma figura! :P

Vinicius disse...

cara, muito bom o texto. Adoro esse tipo de narrativa. até tentei hj, mas não é metade da sua.

Ainda bem q minha irmã é legal!

mg6es disse...

Tudo pelo social, ops, socialismo, socialização, ou, sacanagem mesmo!
Baiano, um dia chego perto de vc, enho fé, visse?

[]´s

Anônimo disse...

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