segunda-feira, dezembro 25, 2006


É esperável que se diga coisas boas.

Eu, às vezes, sou um velho ranzinza, desses de vinte e poucos anos que tem por aí. Resmungo e praguejo um pouco, com velhos chavões da minha laia, como "reafirmo", "eu já falei", "tá cada vez mais assim".
Ando preocupado, atualmente, com esse mundo de gente espaçosa. Tenho visto tanta gente que insiste em ocupar mais espaço do que precisa, do que convém, do que tem direito, principalmente, sem invadir o espaço dos outros. Muitos transeuntes, outros muito próximos.
E tem ainda quem nos critique - a nosotros, que preferimos um pouco mais de discrição -, por falta de ambição, jogo de cintura, política, sangue no olho.
É o tempo do ídolo Roberto Justus, e eu queria mesmo que o pobre coitado que o demitiu não chorasse tanto depois.
E estamos precisando, vejam como esse mundo gira!, voltar a ter lanterninhas nos cinemas!
(Se bem que talvez essas idéias sejam só ecos do meu mau-humor.)
Não é sem propósito tudo isso, deixem que eu diga - antes que vocês achem que estou só querendo estragar a noite.
Natal, fim de ano, é tempo de dizer coisas boas, e de preferência de fazê-lo com sinceridade. Depositando esperanças, procurando-as dentro de si, enaltecendo o que temos de bom para oferecer e para colher.
E vocês são as minhas esperanças. Meus bons amigos - que não ocupam tanto espaço.
E cultivo a esperança de que estejamos mais próximos num futuro próximo, nas próximas ocasiões, na proximidade não de um bairro, um telefonema, ou um blogue, orkut, e-mail, mas de um abraço.
Feliz natal!
E um 2007 mais próximo para nós!
[]´s

quarta-feira, dezembro 20, 2006

¿É amor?

O amor q’eu sempre senti por você me fez enxergar na escuridão por muito tempo. Desde o tempo em q’eu não havia nascido, pois antes de você eu nem existia, eu já esperava te encontrar. Era como ter certeza da certeza do seu ser, ainda que em minha imaginação, de nós dois sempre juntos, como deveria ser.

E mesmo surdo, sempre ouvi sua voz chamando meu nome e dizendo que também me ama. E se muda você fosse, ainda assim entenderia cada palavra cega que você dissesse, mesmo sabendo que você não entende nada do que falo porque estou sempre falando grego com seu coração. E não importa a minha língua, nada posso quando sonegado. Sou negado.

Apesar do tempo que passou e de tudo que perdi, ainda me afogo sempre que te vejo, num cheio de ar no pulmão e a incapacidade de respirar, um sufocar de desespero, com o coração sussurrando qualquer coisa que não quero ouvir. Desde aquela vez, quando não entendi seu olhar de adeus, sigo querendo respostas e encontrando pelo caminho dublês de você, inventando um novo dia, quando todo dia, sem você, é igual.

Hoje sei que foges de mim, por labirintos que não compreendo, estradas que não conheço e caminhos por onde não posso trafegar. Mesmo assim meu amor resiste, sem você, como um lutador na cova dos leões, precisando viver, na esperança de sair dali, liberto e vencedor, pronto para encontrar tudo aquilo que ele sabe: é amor.

Mas na desesperança desesperada e te encontrar, me escondo em cavernas que criei para viver essa vida ordinária de eremita, buscando em mim a parte de você que me falta, pois sei que ao encontrá-la em mim, não precisarei mais do teu porto, seu corpo seguro aquecendo esses dias frios de verão. E sigo cantando versos e lendo canções, vivendo contigo a imagem e ação, minha imaginação.

Mesmo miseráveis os meus versos, é pra você que me dedico, me inspiro pra escrever essas mal traçadas tortas linhas, desse meu amor torto e diferente, sobre a sua indiferença. E mesmo sendo errado o amor é sempre bom e, te amar me acalanta. E na esperança desse amor pretenso bom, sonho com o dia que os seus lábios ofegantes hão de se entregar assim: me leve até o fim porque você nasceu pra mim.


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Livremente inspirado em algumas belas músicas. Mas a verdadeira inspiração vem dela, minha eterna musa.

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sexta-feira, dezembro 15, 2006

Vícios Imorais

Ligou a antiga vitrola, ainda conservara o costume de ouvir música na velha máquina. Para ele, a música dali saia com uma pureza maior do que nos equipamentos modernos. Escolheu, dentre a sua vasta coleção de LPs, o segundo disco de uma das suas bandas preferidas; Strange Days, de 1967, uma das obras primas do The Doors. Apesar do costume de ouvir música na vitrola e de ser um apreciador do rock dos anos 60 e 70, Júlio era novo. Tinha exatamente 25 anos e 3 meses de idade, entre cigarros, baseados e bebedeiras.

Sentado na sua poltrona, bebericava o seu Whisky e fumava mais uma carteira de cigarro, enquanto ouvia som entorpecente daquelas guitarras e da voz de Jim Morrison. Estava para fechar os olhos, quando a campainha do seu apartamento tocou. Foram dois curtos toques e mais três batidas na porta. Ao ouvir isso, logo entendeu. Era Karla, a sua prostituta.

Ele conhecera Karla havia mais de três anos. Conheceram-se na festa de um amigo de Júlio, que tinha o costume de pagar algumas prostitutas para garantir a diversão e animação da festa. Mal se olharam e entenderam que entre eles havia um tesão inexplicável, invisível. Karla tinha um jeito de andar que excitava Júlio só de vê-la. Júlio tinha aquele charme de intelectual frustrado que molhava a calcinha de Karla toda vez que ela o olhava. Passaram três anos, trepando sem amor, só com um desejo inexplicável, um desejo que vinha e que, depois de satisfeito, ia embora tão rápido que nunca sabiam o que falar nem como se olhar após o ato.


Karla chegara ao apartamento de Júlio com a intenção de foder com ele pela última vez. Não agüentava mais aquela sensação estranha que tinha ao vê-lo, era tanto tesão que lhe tirava do sério. Era um tesão puro, nu, sem nenhum pingo de amor, paixão ou até mesmo de admiração mútua. Era um fogo que crescia ao se olharem e tinha seu clímax no gozo. Os dois sempre gozavam juntos, desde a primeira trepada na casa do amigo de Júlio. Karla nunca, em sua vida de prostituta, tinha gozado tanto e de uma forma tão intensa como gozava com Júlio. Isso a incomodava, por isso juntou as suas economias e decidiu viajar para bem longe daquela cidade provinciana, decidida a nunca mais ver Júlio na sua vida.

O simples movimento de abrir a porta fez incendiar o apartamento. Ela o agarrou e jogou ele na cama, tirando-lhe a camisa. Ele, ofegante, ainda teve tempo de desabotoar a calça, enquanto ela, louca de tesão, abaixava-se para chupar aquele pau que te dava tanto prazer. Chupou com tanta vontade, com tanto tesão, que se não fosse pelo controle mental de Júlio, ele teria lambuzado aquela garganta com o seu sêmen. Depois de chupado, Júlio enlouqueceu. Transformou-se num bicho do mato. Rasgou a blusa de Karla e mamou naqueles seios de forma tal que arrancou gemidos de prazer intenso na prostituta. Desceu e encontrou a vagina, molhada e só a espera do encontro com aquela língua e aqueles lábios já conhecidos. Karla pensou ter experimentado, naquele momento, um pedaço do paraíso; de um paraíso infernal, do paraíso do prazer daqueles vícios imorais que tanto lhes consumiam. Transaram feito bestas, gozaram não menos que cinco vezes naquela noite, com uma força, um vigor, que parecia que iriam explodir de prazer. Depois, cansados, dormiram pela primeira vez, abraçados e feito crianças depois de um dia longo e cheio de travessuras.

Karla acordou mais cedo, olhou para aqueles óculos jogados no chão, aqueles livros na estante e aquele macho nu que lhe dava tanto prazer. Sentiu saudades. Pensou em deixar um bilhete, explicando-lhe o motivo da sua ida, mas, ao invés disso, deixou a sua calcinha com uma frase. "Pelos nossos anos de tesão, de bebedeira, de vícios e de imoralidades, parto para nunca mais voltar, meu amor." Deixou a calcinha no criado-mudo, ao lado da cama. Com os olhos lacrimejando, Karla partiu, para nunca mais voltar e nunca mais sentir o prazer daquelas imoralidades.

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Dois é R$ 0,50, quatro é R$ 1,00 e seis é um valee!!

Duas da tarde numa Salvador em que o verão já se faz sentir com toda a sua quentura. Sol a pino. O cenário? Uma parada de ônibus de qualquer de um dos bairros populares da cidade...

Com a proximidade do natal, é impressionante a profusão de bugigangas dispostas caoticamente nas barracas de ambulantes. Pra deleite da gurizada e das mães, é um tal de camelô balançando bonecos dentro de bolas de neve, CDs genéricos de canções natalinas da Simone e luminárias neón de todas as cores que nem se vê mais tanto aqueles relógios despertadores com ruído irritante que em geral são postos todos pra tocar a cada 10 minutos. O in nesta época do ano são 'coisas natalinas' (entenda-se por 'coisa' o que quer que seja plástico, tenha muitas cores, seja barato, barulhento, venha da China e - se tiver vozes pré-gravadas - fale Inglês).

E eis que numa barraquinha improvisada, um ambulante pusera (porcamente suspensa por umas tábuas finas e ligada ao gato puxado duma loja próxima) uma tv de 20 polegadas donde saía a imagem distorcida de um DVD genérico do Edson Gomes (distorção devida sabe-se lá se ao fato de ser genérico o DVD ou a tv). Obviamente o som posto bastante alto e abafado tinha o duvidoso objetivo de atrair compradores em potencial. Mas não é que estava funcionando? Dois ou três rapazes, que bebiam distraidamente umas latinhas de cerveja em pé mesmo enquanto esperavam a condução já rondavam por ali, nitidamente interessados, e começavam de forma tímida a ensaiar alguns passos de reggae, ostentando suas clássicas bermudas de nylon caídas muito abaixo da linha da cintura (e evidentemente abaixo também das próprias cuecas) e óculos escuros de plástico, ao tempo em que já apareciam os comentários de praxe aqui e ali: "Porra, maluco! Isso aí sim é que é show, vú!". O camelô, atento à movimentação, procurava atrair a atenção dos passantes para o resto de seu material. E assim, numa profusão de cores desbotadas (típica de barraquinhas de ambulantes de DVDs invariavelmente impressos em impressoras caseiras), estavam ali expostos alguns dos maiores expoentes da música brasileira recente (em suas versões genéricas, obviamente)... o Psirico... a Nara Costa... já havia mesmo uma menina depreciando um DVD do Harmonia do Samba (como é comumente sabido em Salvador, depreciar um produto é parte significativa do processo de regateio... o provável comprador o deprecia, o vendedor o valoriza, e chega-se a um consenso razoável para ambas as partes).

Mas nisso aproxima-se um pastor evangélico, e percebendo ali na aglomeração caótica do ponto de ônibus um rebanho em potencial, se não contrito, pelo menos inerte ao sermão que viria, abre calmamente sua bíblia, mira alguns rostos mais próximos com olhar superior e, ao som de Edson Gomes e do megafone que ao longe anuncia creme para cabelo em promoção, começa a destilar seu rosário de palavras ora duras, ora condescendentes, vociferando um inferno demoníaco para os não-fiéis. Esgoelando-se para uma platéia que ignorava-o solenemente, o homem, do alto de seu paletó e gravata puídos e debaixo dum sol literalmente escaldante, suava em bicas, e só mesmo atribuindo aos mistérios da fé sua presença no meio de uma parada de ônibus, num calor daqueles, vestido daquele jeito. Uma senhora obesa, vestida numa espécie de roupa de lycra que lhe delineava as formas fazendo-a sobrar - e muito - para todos os lados, observa-o distraidamente ao lado da filha, enquanto espera seu ônibus. Está contente... afinal, comprou o som portátil que tanto vinha querendo, e o pagaria em 17 módicas parcelas mensais de R$ 10,00. Nem a filha, chorando há mais de meia hora por um daqueles picolés capelinha que o vendedor passava vendendo a toda hora a 40 centavos, conseguira lhe tirar o humor. Chega seu ônibus, pagam a passagem (com o cartão de estudante da menina) e passam juntas pela catraca, obviamente.

E o dia continua quente demais... e continuam barulhentas todas as barraquinhas de camelô... e continua gritando o evangélico... e as figuras de Salvador estão todas ali.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

A fala na palma da mão

Sua boca não pára um só instante, mesmo que calada. Fala, sorri, boceja, se contrai, descontrai, atrai, canta e encanta.

Ele conversa com minha respiração, com meus batimentos cardíacos, com os fios do meu cabelo e os sinais do meu rosto. Logo ele que me ensinou a não constranger o silêncio com palavras... Que me fez entender a linguagem das mãos que se buscam, calmas.

Ele segura minha mão na sua própria para que elas possam ter conversas sussurradas. O amor é um murmúrio constante, não um grito. O amor não tenta se transfigurar em desejo. O desejo é que tenta se transfigurar em amor, a medida que o grito se extingue. O amor é um espasmo. Um beijo mirado na ponta do nariz ao invés da boca. Um gesto simples como andar de mãos dadas.

Nossas mãos são eternas apaixonadas. Se atraem com uma facilidade surpreendente - a minha direita com a sua esquerda e vice e versa. Se amam entrelaçadas, transpiram, respiram seus próprios odores. Se casam todo dia na mais sagrada união. Brincam com as linhas que estavam em sua companheira antes mesmo de chegarem, porque o amor não apaga o passado, não é desmemoriado. O amor respeita a história das mãos. Não tem a intenção de curar os calos, mas de conversar com eles. Intenta fazer a mão vestir-se de luva para desnudá-la e beijar todos os antigos sinais. O amor não atira o passado pela janela, mas preserva-o sempre na palma da mão.

O amor não se apaixona. É, desde que nasce, um eterno apaixonado. O amor toca as mãos antes de tocar a coxa. Toca a alma antes de tocar o sexo. Toca a intimidade, mas não se intimida. Não gosta de jogos de conquista, porque já foi conquistado. O amor se entrega de bandeja.

O amor dele é a mão que se cola na minha para conversar sobre nada. Que pede permissão à cintura para acariciá-la. Que sussurra palavras bonitas para meus cabelos. Que se admira com um sorriso. Que escreve sua história nas linhas das minhas próprias mãos. É o que muda minha escrita quando, inevitavelmente, escrevo com mãos apaixonadas.