terça-feira, outubro 04, 2005

Tem um anjo do bem que a olha ... e sempre lhe acerta gotas da paz.


Deixou de ser comum o permanecer na cama, o olhar para o teto em busca de rotas, as lágrimas por não saber em qual delas crer como o caminho da verdade. Havia até um Santiago e uma estrada longa de ressureição, mas só havia. E tudo deixou de ser comum, dentro da rotina que se seguiam as horas. Era a mesma coisa e isso passou a ser grave.

Nem mesmo a normalidade tem trégua. E foi assim... por repetidas vezes. Até que a consciência se afogou no pântano, mas não sem antes deixar um aviso: Preciso de um galho amigo, estou submersa, não afundarei até que ele me toque os dedos.

Mas os dias se passaram. O aviso ecoava por cantos e ouvidos conhecidos. Era um chamado, mas ninguém sabia. Acharam que poderia ser o lamento do vento anunciando uma tempestade. Ou a despedida cantada da madrugada. Mas ela estava lá, afogada e viva, se assim poderia descrever-se.

O sono passara a ser aliado. Subterfúgio para as ameaças contidas no movimento. O mover-se para as ações desajeitadas da alegria, para as bebedeiras pelo prazer das caras sorridentes, para o desempenho costumeiro do trabalho, para a maratona desenfreada do amor. Tornou-se sono, tudo o que lhe seria êxtase.

Quebrava-lhe o sono apenas a fome insaciável. Supria de satisfações açucaradas a falta de cor no quarto, na sala, por trás da janela. Deformava-se a cada aparição no espelho e nem isso parecia importar.

Continuava a ver as rotas, mas as pernas pesavam os quilos da insegurança, do medo sem propósito, do coração descompassado, do vazio tão cheio de solidão. Ela descobrira a ausência de força que nunca deveria ter deixado se rebelar. Vinha dela e isso a fazia sentir-se culpada.

Ainda lhe restava a sombra do que era. Do otimismo defendido e pregado, da voz empostada as músicas, da emoção pelas sensações boas. E era isso que mostrava, a sombra.

Eram gotas de paz...

Só atentos mostraram seus pais. Tum...tum...tum... e assim foram por serem amor e paciência além das medidas.

Nem tão ouvidos os amigos. Sentiam a falta dela, na mesa de bar, ela faltava, nos desabafos pouco se tinha dela. E ela pouco tinha deles.

E ela confusão. Derramava suas aflições e momentos a quem não queria ser banhado dos seus dias. Ganhava nova frustação.

Algumas conversas especiais, acompanhadas da lua ou de uma garrafa de vinho. E sim, esse era um alento.

Mas nada poderiam os outros contra sua resposta apática a tudo que acreditava...nem as cápsulas, nem as lágrimas, nem as músicas ou poesias, luas regadas a vinho... precisava de si e isso não sabia mais ter.


Tem um anjo do bem que a olha... e sempre lhe acerta gotas da Paz.

E enfim ela conseguiu ouvir-se... em uma madrugada tão cheia dela... jogou os próprios galhos... pediu perdão ao Anjo por ter tentado desviar-se das gotas... perdoou-se... despertou sentindo seus próprios movimentos... Ainda boceja o sono intranquilo algumas vezes, o rejeita... E sente a Paz lhe tocar os dedos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ah... os momentos de reflexão são, as vezes, nossas torturas. São o que são, e mesmo já os conhecendo tão bem ainda assim os tememos sempre. Pesam sobre nós duas vezes o mundo. Curvamo-nos sobre nossas pernas e sentimos a enorme vontade de ficar ali... num lugar escolhido, parado como que hipnotizados. Criamos nossos próprios “galhos” que se fartam em desviar as gotas... Imagino que exista a hora em que encharcado de tantas as gotas escorrem e nos atingem pelos cantos. Paz. Serenidade para poder olhar o mundo descolando de nós mesmos... nosso fardo diminui-se assim. Somente o nosso próprio mundo será o nosso fardo, o outro se desfaz e agora já podemos sentir que tudo era uma ilusão de ótica, um espelho rachado. Sempre tivemos o mesmo mundo no mesmo farnel. O que muda somos nós diante dele. E as gotas caem com mais intensidade e nos lavam e carregam pelos bueiros as nossas angústias. – Sei que escrevi demais, meio a necessidade de escrever, meio a vontade de receber as gotas deste anjo da paz. Abraços