domingo, dezembro 04, 2005

A vida é uma eterna celebração de encontros

Ele, um homem comum, entre tantos homens, nunca foi de fazer sucesso com as mulheres. Talvez as desvantagens físicas, ou ausência de predicados e audácia fizessem dele um tipo qualquer. Ela, de beleza extraordinária sem vaidades, batons e cabelos, nunca se preocupou com o sucesso que fazia entre eles. Livros, crescimento cultural e profissional sim eram seu foco.

Ele nunca acreditou em amor, muito menos à primeira vista. Ela, muito prática, sempre se preocupou com sua carreira e condição de mulher moderna. Casamento, filhos e família feliz nunca estiveram em seus planos.

Mas o destino, este tão desacreditado por tantos, resolveu pregar-lhes uma peça...

Caminhando pelo shopping, entre uma refeição e a leitura do periódico, os dois se tropeçam num balé absolutamente esquisito. Entre os pedidos de desculpa e consternação pelo sorvete derramado, seus olhos se encontram como o sol no horizonte após mais um dia de trabalho. Magnetizados por uma energia totalmente inexplicável, a ausência de palavras dá lugar ao constrangimento de tamanho sentimento que como mágica tomou conta daqueles dois. Pedindo licença ao poeta e ao clichê, naquele momento até as estrelas se esqueceram de brilhar.

Ainda sem as palavras corretas, ele toma-se a pedir desculpas, num gaguejo desconcertante. Ela, numa tentativa frustrada de praticidade, põe-se a limpar seu paletó. Mas o encontro de suas mãos naquele dorso de homem fez faiscar aquela energia estranha que ainda os circundava. Entre olhares e o vazio do som, os dois pensam em lampejos sobre o acontecimento. Tentam explicar a qualquer custo aquele sentimento estranho que tomou conta de seus corações. Após longos segundos, ele ainda que timidamente, toma a iniciativa e puxa um assunto qualquer, baseado na leitura da outra. Ela, ainda perplexa, responde perguntas que não foram feitas.

Sorrindo, ainda que sem dentes, os dois postam-se a conversar já sentados num banco de praça de shopping center. Suas faces agora possuem expressões simétricas e a timidez dá lugar à gargalhadas gostosas e espontâneas. Com o adiantado da hora e o fim do horário do almoço, trocam telefones e promessas de futuras ligações.

Ele ainda busca respostas para o que aconteceu. Como pôde ele, tão fechado ao amor, sentir aquele turbilhão de sentimentos por uma desconhecida? Não é a beleza, nem a pretensa inteligência daquela mulher. Era algo misterioso que ele, cético, não saberia explicar. Ela, num exercício vão, fez-se de tola e ignorou tudo aquilo. Mas intimamente deseja ouvir aquela voz, mesmo que por telefone e sentir mais uma vez aquele peito em suas mãos.

O tempo parece não passar e os minutos transformam-se em horas, até que ele, num impulso, pega o telefone e disca a senha para o sonho de ouvir, mais uma vez, a doce voz daquela desconhecida. Mas o que ele diria, já que conhecera a mulher a menos de 30 minutos? Que justificativa teria para ligá-la? Ele não poderia parecer interessado ou desesperado, já que ela não parecia o tipo de mulher que caça homens em shoppings. Até que lembrou do detalhe que fez a diferença: diante dos acontecimentos, ele esqueceu de perguntar seu nome. Esta seria a melhor das desculpas.

Ela, do outro lado da antena, atende ao telefone aos pulos, tentando manter a voz tranqüila e o compasso da respiração. Agora eles já sabem seus nomes, telefones e segredos.

E na sexta-feira o que parecia sonho resolveu virar realidade. Entre uma borrifada de perfume e a maquiagem mal-feita pela falta de prática, ela o aguarda como a mãe espera um filho chegando da guerra. Ele, na difícil escolha da tríade gravata, flores e vinho, transforma o trânsito em fórmula 1, para não chegar atrasado.

Ao toque da campainha, com o coração pulsante e carne trêmula, corre em sua arrumação para abrir a porta. Ele, do outro lado, tem a pele fria e as mãos suadas. Mais uma vez seus olhos se fitam e o silêncio, insistente e inconveniente, faz-se presente. A timidez do momento faz o ter o que dizer no não saber o que falar.

E com a mistura dos odores (jantar, vinho e sexo), os dois conversam sobre todos os assuntos que se pode conversar. Entre um gole e outro daquele vinho seco, não tão seco quanto a saliva que insiste em não descer, a conversa e o riso dão lugar a um magnetismo que inevitavelmente puxa seus corpos um contra o outro. E quebrados o medo e a resistência, seus lábios se colam e suas línguas passeiam pelo infinito de suas bocas. E o que era antes roupa, agora é trapo, porque a força que os moveu até ali não teve educação para despi-los.

E com o vinho derramado pela taça quebrada ao chão, os dois se amam. E o tempo do amor que fazem é do tamanho da distância que separou aquelas almas e aqueles corpos. E juntos, chegam ao momento mágico do gozo. E ela dorme ali, nua ao chão, como uma criança de sono inocente e uma felicidade que não cabe em si. Ele, com todas as respostas, fica acordado velando aquele sono e contemplando o amor inusitado e único que ele não sabe como começou e que não pensa em terminar.

E com o sol em seus olhos, despertam de um sono que não teve sonho, porque não poderá mais haver sonho em qualquer sono, já que o sonho era estar acordado, cada um com o seu você. E contemplando um ao outro, passam o dia ali, naquele chão mais confortável que qualquer cama, amando a toda hora, porque amor nunca desperdiça. E eles agora sabem disso.

3 comentários:

Diógenes Pacheco disse...

Foi o jeito de contar que se armou sexta, bróder? :)

[]´s

Luana disse...

Com um texto desse dá até vontade de me apaixonar novamente... Muito bom! :))

Vinicius disse...

ah baiano, quem me dera a chance de encontrar um amor assim, por acaso. sou do tipo que erro até quando forço a barra para encontrar o amor...