domingo, setembro 04, 2005

Numa outra cidade, tudo é novidade (até as mesmas coisas)

Nem tão perto, nem tão longe. O suficiente para ouvir os aviões que pousam e decolam do aeroporto local. Agora pela manhã alguns passarinhos mais corajosos cantam suas canções, apesar do frio constante e da ventania. Da janela do meu quarto ouço sons que não conhecia. Não tão de perto. É bom ouvir essa música de cidade estranha.

Alguns sons são familiares. Alguns carros passam na rua. Alguns batem e outros freiam assustados. Ouço vozes, sorrisos e conversas. Não sei do que falam e também não sei se a conversa deles é mais interessante que o meu silêncio. Buzinas, muitas buzinas. É o mundo com pressa em plena manhã de sábado.

Ontem o ciclone deu uma passada por aqui. Ele já estava cansado, porque teve que correr muito antes de chegar até onde estou. Dessa vez eu ouvi o som de um vento raivoso. Não são aqueles uivos de fantasmas. São gritos e lamúrias. Minha janela tremeu um pouco, mas não quebrou. Mas eu vi uma bandeira do Brasil voar do seu mastro imponente, uma árvore magrinha deitar na grama e duas placas de sinalização dar adeus a seus postos. Vi um abrigo de trem encontrar o chão e me vi saltitando e rodopiando no pátio da fábrica igual a uma gazela bêbada tentando voar. Espero que só eu tenha visto esta cena.

Agora ouço sirenes. Pela freqüência é do corpo de bombeiros. Um incêndio talvez. Ou quem sabe um acidente grave. Vou torcer que seja apenas o resgate de um gatinho que não consegue descer da árvore. Esses gatinhos imprudentes... Não sabem avaliar o risco que correm ao subir numa árvore. Se não consegue descer, para que sobem? Provavelmente para dar trabalho aos bombeiros.

Passados cinco minutos tentando encontrar um novo som fui surpreendido pelo silêncio. Nem passarinhos corajosos, nem freios, aviões ou sirenes. Mas agora tem um casal no quarto ao lado fazendo uma festinha bem legal. Bom, quero crer que sim, pois tem alguma coisa parecida com uma cama batendo regularmente na parede do meu quarto. Acreditem, as paredes dos quartos são de brinquedo. Algum tipo de gesso armado e oco que nos permite ouvir o que acontece do outro lado. Vou tentar ser mais discreto na minha próxima festinha bem legal...

Mais um avião. Gente chegando e gente dizendo adeus. Nessas minhas viagens não tive para quem dizer até logo ou que saudade. Não no aeroporto. Mas a gente sempre se acostuma com tudo. Porque o homem é o animal que melhor se adapta. Eu me adapto. Questão de sobrevivência.

Agora quero esquecer um pouco desses sons do mundo e me concentrar um pouco na coisa que mais gosto de fazer: ouvir música. Agora ouço uma banda chamada Fleetwood Mac. A música? Merry-go-round. Um blues romântico, desses para se ouvir tomando um bom vinho, fumando um bom charuto e ouvindo a festinha do apartamento ao lado, já que estou sozinho... Pelo menos por agora.

P.S.: para quem não conhece a banda, sugiro começar com o Álbum “Peter Green’s Fleetwood Mac de 1968”. Jóia rara do blues.

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Vini!

Já comecei gostando do seu texto pelo título... Para cada lugar as mesmas necessidades, mas como tudo parece diferente fora do nosso canto, né?

E todo o resto é muito bom... das tuas palavras ao gosto da saudade...

Beijo grande!

Diógenes Pacheco disse...

Levou o ciclone com você, velho?
Saltitando e rodopiando, gazela querendo voar? Ihh, rapaz...
Não sei se era o caso, mas teve a parada gay aqui ontem. Se prestou, não me pergunte, que eu tava em casa com minha nega vendo o jogo do Brasil. :)
No mais, boa sorte por aí!

[]´s

Leonardo Caldas disse...

sempre que leio coisas tuas daí do sul, lembro duma letra (dos Engenheiros do Hawaii, acho...). não sei o nome, mas tem um trechinho assim: "Amanheceu em porto alegre" ;)

Marina disse...

Gostei do texto, Vini!

E Fleetwood Mac é massa! ;P

Beijos!

mg6es disse...

Aê, grande Vini! Vc conhece Salvador, ainda? :)) Belo texto, uma perfeita fotografia de uma terra alheia, que, tbm se faz alheia a tudo, vive seu curso, como é natural, à revelia de dores e odores de outrem. Sempre acho ser ignorado nos lugares que não conheço, isso me move a sempre voltar pra casa. Ah, tou ouvindo Sara, de Fleetwood, vlw a dica, não conhecia!

[]´s